MANIFESTO DA DIRECÇÃO: Este blogue “www.sortesdegaiola.blogspot.com”, tem como objectivo primordial só noticiar, criticar ou elogiar, as situações que mais se distingam em corridas, ou os factos verdadeiramente importantes que digam respeito ao mundo dos toiros e do toureio, dos cavalos e da equitação, com total e absoluta liberdade de imprensa dos nossos amigos cronistas colaboradores.

sexta-feira, 12 de abril de 2013



De José Zuquete para Juliano Louceiro



JULIANO LOUCEIRO




Passado quase um mês da sua morte venho hoje falar-vos de um homem de quem me orgulho de ter sido companheiro, amigo e irmão durante a sua vida. Uma vida repleta de bons momentos, de outros menos bons, mas sempre na luta, pois de um lutador se tratava, com grande carácter e enorme coragem. Sendo um homem algo introvertido, sabia expressar como poucos o sentimento da amizade para com aqueles que considerava seus amigos. Mas atenção àqueles que o defraudavam, que entravam de imediato no número dos imperdoáveis.

Não poderei esquecer alguns bons momentos que com o Juliano passei, entre os quais o que se passou quando me desafiou para ir tourear com ele a Espanha. A corrida era em Zalamea La Real, eu, o Juliano e dois novilheiros. O empresário encarregou-se de arranjar os bandarilheiros, ficando assim as despesas mais curtas. No dia da corrida saímos os dois no meu carro e não me esqueço que em plena Serra do Caldeirão o Juliano me pediu para parar. Assim fiz e qual não é o meu espanto quando ele saiu do carro e começou a gritar a plenos pulmões numa manifestação de sabia loucura. Depois entrou no carro e disse-me “isto foi para espantar o medo”. Para que as despesas fossem menores, os cavalos iam numa só camioneta, que era do Juliano. Chegados à fronteira que era no Rio Guadiana, qual não é o nosso espanto quando o chauffeur nos disse que não podia passar para o lado espanhol porque a camioneta não tinha os documentos em dia. O Juliano telefonou ao empresário que logo veio tentar desbloquear a situação, o que se revelou impossível pois a polícia não permitiu que o camião fosse para o outro lado. Então o empresário começou a procurar outra solução, que seria um camião espanhol, mas o máximo que conseguiu foi arranjar um camião pequeno que só levava dois cavalos. Eu levava dois cavalos bastante toureados, um Andrade e o Borba, e foram esses que escolhemos para levar para Espanha.

Chegados a Zalamea La Real fomos para casa de um amigo do empresário onde nos fomos vestir. Antes fomos à Praça de Touros, onde esperámos os cavalos que chegaram uma hora antes da corrida. Resolvi emprestar o Borba ao Juliano e fiquei com o Andrade para mim. Não vou descrever a corrida, que correu muito bem, basta dizer que cortámos uma orelha cada um. Também direi que o Juliano, valente como era, se desembaraçou muito bem.

Mais tarde ao jantar, passámos um bom bocado e o Juliano cantou à capella.

De regresso, quando atravessávamos o Caldeirão, parei o carro e disse-lhe “anda, vá, põe-te lá a gritar!” e ele respondeu-me com ar sério: “já não preciso, o medo já passou”.

Homem de grande carácter, um falso duro, que punha a família acima de tudo. O filho Hugo era o seu herói, ao qual só faltou querer tourear a cavalo, para preencher todos os seus anseios. Ultimamente a sua paixão era a sua neta, a qual pôs a tourear a pé. Artista dos pés à cabeça, catava o fado à capella como ninguém e bailava flamengo com a alma e o sentimento dos tablaos de Sevilha.



Juliano, Deus quis levar-te agora, dando-te a morte que sempre desejaste: de repente. E lá par onde foste não te esqueças de dar um grande abraço ao Zé Mestre Batista, teu amigo e meu amigo.



Até um dia…